DOIS ESPETÁCULOS E UM ENCONTRO COM O MAR

DOIS ESPETÁCULOS E UM ENCONTRO COM O MAR


                       (Um comentário crítico e comparativo sobre dois eventos artísticos )

                   por Carmem Teresa Elias reeditado em 28/08/2011

Duas obras artísticas atuais em exibição no Rio de Janeiro são muito felizes na utilização da temática do mar na construção e desenvolvimento de suas metáforas cênicas: o filme “Árvore da Vida” e o espetáculo " Sem Mim " do consagrado grupo de dança O Corpo.

Em ambos, o desenrolar de expectativas, sentimentos, buscas, frustrações, encontros,desejos,amizades, amores, questionamentos mais desconhecidos e inquietantes com  indagações e respostas, enfim, elementos que permeiam a natureza humana, alcançam e realizam uma expressão libertadora e integralizadora no encontro simbólico do homem com o mar; encontro esse que se estabelece nos planos individual, social e universal.

No ballet, vemos apresentações em crescendo de tatuagens, peles, ondulações corporais lapidadas, ora sutis , ora vigorosas, que vão gradualmente explorando as possibilidades do corpo, a manifestação dos desejos, os rituais coletivos, vestindo e iluminando o palco de corpos capazes de firmar sua identidade em uma dissolução do “ Sem Mim”. O título dado ao espetáculo é felicíssimo, pois a figura individual dos bailarinos vai amadurecendo na expressão cênica à medida que amadurece sua identificação pessoal sublimada ao dissipar-se na composição da totalidade do grupo.Excelentes momentos incluem o pas-de-deux sensualíssimo dançado sob um manto que evoca as ondulações do mar dos desejos velados e o  desfecho abrasileirado do espetáculo, que nos conduz ao ritmo de um ritual tribal em canto para o divino . Com trilha sonora criada a partir de cantigas medievais que evocam os primórdios da língua e da literatura portuguesas reconduzidas em versões atualizadas, o espetáculo  ao mesmo tempo um mergulho na História, um consequente emergir no Brasil e na Humanidade da dança. Cabe aos espectadores vislumbrarem a beleza e o vigor dos movimentos dos bailarinos em condução que evoca facilidade e alegria.

Paralelamente, no filme “ A Árvore da Vida” de Terence Malick, a história pessoal e familiar das personagens vai se descortinando e traçando analogiasque nos atingem desde os primórdios  da criação e expansão cósmica do universo e da vida até seu destino final, em uma atmosfera na qual passado, presente e futuro coabitam e se fundem em uma unidade totalizadora. Ao passo em que o desespero pessoal das personagens avança em busca  aparentemente desconcertante pelo sentido da vida e da morte, as personagens caminham, de fato, para um derradeiro encontro transcendental e iluminador, no qual o perdão, a compreensão e a própria felicidade ( sentimentos uma vez pacificados), permitem que todos se reencontrem na ‘ praia’ dos mares calmos, local onde os dramas pessoais se diluem na integração final de todos com o Absoluto.

Indubitavelmente, os dois espetáculos são distintas manifestações de duas linguagens paralelas que podem, por coincidência, serem assistidas nesta mesma semana no Rio de Janeiro. Ambos se complementam e eclodem em um  banho de mar elucidador, capaz de oferecer uma explicação e  significação: o encontro pacificador e regenerador do homem se realiza no encontro de três esferas_  a pessoal, a humana social e a cósmica transcendental_  nesse estado do ‘Mim’ no “Sem Mim” de todos nós diante dos ritos ou do Ser Supremo, Pai Criador.

Para os apreciadores de espetáculos que enlevam a consciência humana, vale a pena conferir esses dois movimentos de uma harmoniosa música chamada Arte.

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